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Marcelo Lamarca :: Ep.06

Qual é o valor disso? Lamarca já quis ‘dominar o mundo’, mas hoje entende que o mundo que precisa ser ‘dominado’ é o dele mesmo. Aquele que revela o íntimo e o inconsciente.

Data

Criador

Interviewer: Pedro Pirim

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29 minutes
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Marcelo Lamarca, artista e formado em design gráfico, recebe Pedro Pirim no apartamento que divide com a artista e psicóloga Cynthia Neimi e a entrevista começa com ele contando um pouco de sua história de vida. Para ele, sua história começa com o design gráfico. Desde criança teve uma inclinação para a arte e vontade de trabalhar com isso, mas esse desejo era acompanhado de dúvidas sobre a possibilidade de sobreviver de arte. Ele chegou a estudar arquitetura e depois partiu para o design gráfico, onde começou a correr atrás de maneiras de incorporar o manual com o digital, mostrando então cada vez mais seu lado artístico. Hoje em dia, ele ainda trabalha no design, mas a transição deu certo e ele estima que atualmente trabalha 80% com arte e 20% com a parte do design gráfico. 

Pedro aponta como frequentemente nas mídias sociais focamos apenas em nossas vitórias, e questiona então quais são as coisas que deram errado para Marcelo. Ele conta como muitas vezes não se valorizava como deveria, definindo-se como um “executor” que quando pedido algo, logo fazia sem pensar no que receberia em troca–algo que ele percebeu olhando para trás. Esse é inclusive um conselho que dá para artistas novos: saiba o valor da sua arte. Quando questionado sobre a origem dessa auto-desvalorização–de quem é a “culpa” de quem, como brinca Pedro–Marcelo aponta que o preconceito com a classe artística por parte da sociedade é um fator muito forte. Ele valoriza muito a profissão artista, tendo sempre sabido que queria trabalhar com arte e experimentado diversos tipos, como música e teatro além da arte visual. Em contraste, a pressão social e familiar sempre foram fatores coexistentes com essa exploração artística. Marcelo pinta desde os nove anos e sempre se encontrou naquilo, mas o fato de que a arte é uma área em que se tende a evoluir de maneira mais devagar, em combinação com comentários casuais sobre a dificuldade de trabalhar com isso, pode desmotivar o artista e até fazê-lo questionar o valor de seu trabalho. 

Quando revisita seus quadros da época em que começou a pintar, ele se encanta com a liberdade que vê neles. Na época, os via como “maluquices” ou aleatórios, e também ouvia isso muito dos outros; hoje isso faz com que aprecie a virtude desafiadora de se importar apenas com a sua verdade e não com o que os outros dizem. Hoje, ele ainda tenta explorar essa liberdade em seu processo, como era exclusivamente no passado, mas reconhece que não é tão fácil depois de anos de pressão. Exatamente por isso, Marcelo está em um momento de resgatar essa criança interior, olhando para ela e colocando em foco a importância de trazer de volta essa liberdade para si e não se cobrar tanto, deixando que as ideias surjam do seu inconsciente. 

Para Marcelo, a arte que mais é verdadeira para ele produzir é a “arte do momento”: o que quer que surja e faça sentido com a realidade tanto do mundo quanto do próprio artista; ele define seu atual momento interior com grande foco em auto-cuidado e observação. Recentemente, passou mais de um mês sem pintar, e ele reflete sobre como esse momento foi importante para observar a absorver as experiências antes de traduzi-las para arte. Mesmo com o foco em autocuidado, Marcelo fala sobre a natural dificuldade de se perceber olhando de dentro. Por isso, frisa a importância de escutar as pessoas que te observam de fora sem resistência ao que elas podem te oferecer, além do quanto a terapia ajuda nesse processo de autorrealização. 

É muito comum a gente ficar resistente quando a gente tá triste, é super normal ficar ‘ah não, eu dou conta de tudo’, só que não. É bom também você fazer terapia, que é também você se escutar, escutar um profissional, escutar o que você tá falando. Acho que a escuta é um caminho bom pra isso.

Photo: Felipe Cantieri

Marcelo também reflete sobre a necessidade e eventual desafio que é pedir ajuda, inclusive na vida profissional. Ele relembra o extremo desconforto que sentia no começo da carreira ao vender sua arte, algo íntimo, e como chamar alguém, a Cynthia, para que pudesse se distanciar do processo da venda foi crucial para se manter bem. Relembrando das questões que o fizeram chegar “no fundo do poço”, Marcelo também frisa a importância de não querer “abraçar o mundo” e conta sobre como a própria terapia ajudou nesse processo. Ele reflete sobre como seu desejo é dominar seu próprio mundo: estar feliz e seguro com o que tem agora, hoje. 

Ao invés de dominar o mundo, Marcelo está mais preocupado em contribuir com ele através das coisas que gosta, como arte e crianças, e da sensibilidade ao olhar tanto para dentro quanto para fora. Ele conta um pouco sobre projetos sociais dos quais participou e recomenda um grande amigo que conheceu através deles para contar sua história para a Voz Futura. Por último, Lamarca diz que essa é exatamente a marca que quer deixar no mundo: que vale a pena investir em lugares e pessoas que normalmente não recebem esse investimento, que existe cor e arte em absolutamente todo e qualquer lugar.

O início da carreira foi muito difícil, muito complicado, eu não sabia como ganhar dinheiro com isso. E depois que o dinheiro veio, depois que começou a trocar a minha arte, uma coisa muito íntima minha, por dinheiro, pra mim foi muito difícil administrar. Eu não conseguia ficar feliz quando recebia dinheiro pela minha arte.

Photo: Felipe Cantieri

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